21 de novembro de 2024
TJ-SP modula aplicação da Lei 14.879 e limita regras sobre eleição de foro
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Por: Alexandre Paranhos

O Tribunal de Justiça de São Paulo modulou os efeitos da recente Lei 14.879/2024, que alterou o Código de Processo Civil, para estabelecer que a eleição de foro deve guardar pertinência com o domicílio das partes ou com o local da obrigação e que o ajuizamento de ação em Juízo aleatório constitui prática abusiva, passível de declinação de competência de ofício. 

Antes da Lei 14.879/2024, o foro (ou seja, o tribunal ou a jurisdição) competente para resolver eventuais disputas decorrentes de um contrato podia ser definido pelas partes. Com a mudança, se as partes escolherem um foro que não atenda aos novos requisitos, o juiz poderá, de ofício, declinar da competência para julgar o caso e remetê-lo para outra comarca. 

O caso analisado envolve a disputa entre uma instituição financeira e uma empresa do setor têxtil, em que o tribunal decidiu pela inaplicabilidade da nova lei a ações ajuizadas antes de sua vigência. 

Recentemente, o TJ-SP reformou a decisão de primeira instância que havia declinado a competência de ofício, com base na nova redação do § 5º do art. 63 do CPC, que introduziu limites à eleição de foro, impedindo a escolha de foros aleatórios. O tribunal, no entanto, entendeu que a aplicação dessa norma a processos iniciados antes da publicação da lei seria inadequada, respeitando o princípio da não retroatividade.

A ação em análise teve início na 2ª vara da Comarca de Brusque (SC), mas tramita atualmente na 21ª Vara Cível da Comarca da Capital do Estado de São Paulo, devido à cláusula de eleição de foro que consta no contrato fechado entre as partes (anterior à nova lei). Tanto a ré como a parte autora se manifestaram expressamente pela manutenção da ação no foro na qual tramita.

Segurança jurídica

Segundo o advogado Daniel Becker, sócio do BBL Advogados, que representou a instituição financeira, a decisão é relevante para empresas e advogados que atuam em contratos com cláusulas de eleição de foro, especialmente em litígios iniciados antes da promulgação da Lei 14.879/2024. “Ela reforça a segurança jurídica e estabelece um precedente que pode impactar futuros julgamentos sobre a competência jurisdicional.”

Becker ressalta que a decisão pode abrir precedentes em tribunais de outros estados e no Superior Tribunal de Justiça, onde a discussão sobre a aplicação retroativa de novas leis processuais ainda é pouco explorada.

Para o advogado Rodrigo Forlani Lopes, sócio da área de contencioso cível do escritório Machado Associados, o TJ-SP, ao aplicar a teoria da irretroatividade em relação à Lei 14.879/2024, também se fundamenta na teoria do isolamento dos atos processuais, que assegura a preservação da eficácia e dos efeitos dos atos já praticados.

“Essa decisão reflete a mensagem clara de que alterações bruscas nas regras processuais devem ser evitadas, especialmente quando as partes envolvidas já haviam ajustado suas expectativas com base no ordenamento anterior”, comenta.

Ainda de acordo com Lopes, o entendimento adotado pelo Tribunal é “particularmente elogiável, pois impede que alterações legislativas desestabilizem processos em curso, nos quais as partes já haviam pactuado termos com base nas normas vigentes à época”.

“No caso específico, a validade da cláusula de eleição de foro firmada pelas partes foi corretamente mantida sob o regime anterior, e qualquer modificação imposta pela nova lei teria causado prejuízos às partes, que, de forma expressa, manifestaram o desejo de preservar o foro inicialmente escolhido. Essa decisão reforça a estabilidade e a previsibilidade no âmbito processual, essenciais para a boa administração da justiça.”

Alexandre Paranhos, sócio do Leite, Tosto e Barros Advogados, registrou que já foram apresentadas diversas críticas à lei, incluindo o retrocesso atual do Código de Processo Civil em relação à desarrazoada limitação à eleição de foro.

“O Tribunal de Justiça de São Paulo teve decisão acertada ao referendar que a aplicação desta Lei se dê a partir de ações novas, justamente para que se respeite as regras de direito temporal e, principalmente, seja evitada uma surpresa das partes em relação às regras que estarão submetidas após o ajuizamento de suas demandas.”

Publicado originalmente no ConJur.